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Americana

Ideias e histórias que só poderiam vir dos EUA

Perfil Luciana Coelho é repórter em Washington

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Lincoln e seus lobistas

Por Luciana Coelho
04/12/12 18:47

WASHINGTON – Será que Abraham Lincoln (1809-65) comprou os votos para aprovar a 13a. emenda, que aboliu a escravidão nos EUA? E se tiver comprado, em quanto isso apequena sua figura?

Lincoln visita um campo de batalha na Virgínia, perto de Washington (à esq.) e sai para a fatídica noite no teatro, onde seria assassinado (à dir.) (Divulgação)

Essas são as perguntas que ficas após assistir “Lincoln”, a cinebiografia do presidente americano dirigida por Steven Spielberg que deve chegar ao Brasil no fim de janeiro e que nas últimas semanas se mantém entre os filmes no topo das bilheterias nos EUA.

Vou deixar em segundo plano a performance incrível e absorta de Daniel Day-Lewis (gênio), o carisma de James Spader (um ator muito melhor após trocar a cara de galã por uma barriga e uma careca, de verdade) e a fotografia hipnotizante de Janusz Kaminski, que há anos dá luz à imaginação de Spielberg.

O bacana do filme (são 150 minutos de projeção) é seu foco na habilidade de negociação de Lincoln e na polarização do Congresso entre republicanos e democratas. Soa familiar? Pois é.

Enquanto a Guerra de Secessão (1861-65) chegava a seus sangrentos momentos finais — muitos deles aqui do lado, na Virgínia — o presidente insistia em aprovar uma emenda que, na época, parecia impossível de passar, e que estava exatamente a gênese do conflito civil.

Os democratas, escravagistas então concentrados no Sul, eram radicalmente contra a libertação. Mesmo alguns republicanos titubeavam e questionavam o que viria depois (direitos políticos para os negros? imagine só). Para conseguir apoio suficiente, Lincoln incumbe três lobistas (Spader entre eles) de persuadirem os legisladores indecisos ou vira-casacas. E aí vale tudo: oferecer dinheiro, cargos, vantagens. O pensamento é puramente maquiavélico: os fins justificam os meios.

É interessante ver uma cinebiografia tão crítica, que mesmo ainda louvando Lincoln como herói o mostra como alguém corruptível, venha justamente do superufanista Spielberg.

Historiadores chiaram, dizendo que a questão do suborno é uma interpretação do diretor, do roteirista Tony Kushner (de “Munique” e “Angels in America”) e do próprio Day-Lewis, que desceu seu Lincoln para o mundo dos mortais e o dotou de senso de humor, senso de oportunidade política, ambição e angústias. No registro histórico, consta apenas que o presidente mandou emissários “conseguirem” os votos.

O exercício da crítica contra uma figura histórica tão reverenciada costuma ser raro por aqui. Nos EUA, os “founding fathers” (os responsáveis pela Independência, como Jefferson, Washington, Franklyn — John Adams costuma ficar injustamente fora) são tratados como deuses. Teddy Roosevelt e Lincoln, também. Quase como se não fossem humanos, passíveis de erros.

Ver esse Lincoln que titubeia e falha na tela é portanto reconfortante. Mas aí surge outra dúvida: estaria Spielberg validando a corrupção, por que o objetivo, afinal, era nobre (acabar com a escravidão)?

Por outro lado, fica também a sensação de que para passar algo grandioso é preciso desagradar um bocado de gente e elevar suas apostas. Até que ponto?

Não sei se Lincoln fez do melhor jeito, se um grau de cinismo aí é aceitável. Mesmo assim, Obama e os republicanos, presos a embates infindáveis sobre questões muito menores, podem ter o que aprender com seu ex-presidente.

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Comentários

  1. Otávio Jorge Caldas comentou em 05/12/12 at 9:02 am

    Um filme é sempre o ponto de vista do seu diretor (ou de seus produtores), mas acho que estamos diante de mais um ótimo trabalho do Spielberg. Ainda bem que temos a opção de tirarmos nossas conclusões. Um abraço e parabens mais uma vez pelo seu trabalho.

    • Luciana Coelho comentou em 05/12/12 at 5:10 pm

      O filme é muito bom, Otávio, recomendo. Abs.

  2. nelson tadeu daniel comentou em 06/12/12 at 10:58 am

    E importante pois toca em um ponto que esta em moda aqui no Brasil a corrupção dos políticos em troca de apoio. E fundamental um amplo debate sobre o tema. Aqui a questão e endêmica os meios justifica o fim. No meu ponto de vista aqui e a falta de educação e valores das pessoas. O dinheiro fala mais alto que a etica, a moral, a dignidade quando a questão e politica. O principio se aplica dos mais altos escalões da Republica ao mais simples vereador de uma pequena cidade do nordeste. A evidente a mistura das questões de interesse privado com a cargo publico.

  3. Bosco comentou em 06/12/12 at 2:37 pm

    Luciana, gostaria de acrescentar que a libertacao dos escravos nao foi um ato meridianamente claro; ao contrario, foi confuso. Lincoln nao tinha ideia certa a respeito do tema. Os escravos do sul foram libertados como punicao aos estados rebeldes. Os comandantes militares iam assinando “em cima da perna” a situacao dos escravos em cada territorio… A sucessao da guerra e dos fatos, atropelou Lincoln e o Congresso levando para a Emancipation Proclamation. Um colega seu, Frederick Douglass, foi um gigante nesse processo… Quanto a John Adams, se Jefferson eh considerado o pai, Adams eh visto como a Mae da Constituicao americana. Silenciosamente, diligentemente, implementou-a entre os estados…

    • Luciana Coelho comentou em 06/12/12 at 6:26 pm

      Oi Bosco! Obrigada, concordo com você. Começando do John Adams, sempre me irritou um pouco essa adoração toda pelo Jefferson, deixando ele para segundo plano. Sobre o Lincoln, sim, a libertação não veio porque ele era *bonzinho* puramente (assim como não foi o caso com a nossa celebrada princesa Isabel). Acho que o filme mostra bem esse dilema, de eles defenderem a abolição sem contudo se sentirem preparados para aceitar os negros no sistema político (e aí que acho que entra o papel do Douglass). É bizarro defender uma coisa sem a outra. abs!

  4. EdsonCadette comentou em 10/12/12 at 4:20 am

    Ola Luicana,
    Pelo que tenho lido e visto sobre a historia norte americana, o presidente Lincoln talvez nao fosse a favor da escravidao negra. Entretanto, fica claro que sua luta era para manter a Uniao e nao libertar os escravos. Ele recorreu a este recurso de libertar os escravos, e com isto enfurecer tanto os republicanos, como os democratas sulistas para que os negros libertos lutassem contra os estados sulistas escravocratas depois de consultar com alguns de seus assessores e generais. Na epoca alguns generais nao aprovavam negros vestindo a farda da Uniao. O filme “Glory” mostra bem este lado.
    E interessante notar nestes debates sobre a escravidao, onde o sul e pintado como a unicao regiao onde a escravidao floreceu. Nova York tambem foi um bastiao da escravidao. A ecravidao nos estados do Norte deveria ser melhor estudada.
    E claro que nunca iremos saber o que se passou de verdade na cabeca do presidente. Porem, acredito na teoria de que Lincolm queria mesmo era preservar a Uniao, e se para fazer isto ele teria que contar com os negros livres lutando a seu favor, entao que assim fosse feito.
    Ha uma gama enorme de estudos sobre o periodo pos Emancipacao, chamado aqui de “Reconstruction”. A epoca dos linchamentos de negros que desafiavam o “status quo”, e tambem do aparecimento da KKK. Sera que o senhor Spilberg tocara neste espinho tambem?

    • Luciana Coelho comentou em 10/12/12 at 8:31 pm

      Duvido que toque. Mas, sim, parece que é algo que só se praticava no Sul. Não há como negar, porém, que a dinâmica no sul foi mais duradoura e perversa. Sobre o Lincoln, só podemos chutar, mas me parece (por leituras e pelo filme) que ele não era um abolicionista entusiasmado, mas apoiava o fim da escravidão. Agora, que o momento da libertação foi uma manobra política (e a julgar pelo filme, maquiavélica), isso foi. Abs!

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